Assim como George Harrison nos Beatles, Richard Wright era o terceiro compositor (e eventual vocalista) do Pink Floyd. Tal qual o ex-Beatle, era ainda o integrante mais quieto, de personalidade mais introspectiva, mas de inegável talento. E também como Harrison, sua influência na sonoridade da banda em que foi o tecladista por quase 40 anos é incontestável. Membro fundador do grupo, junto com Roger Waters e Nick Mason, seus colegas na faculdade de arquitetura, Wright foi o maior responsável pelo som espacial, característico do Floyd depois da saída forçada de Syd Barrett no final dos anos 60.
Apesar de participar ativamente do processo criativo, suas primeiras contribuições ainda não trariam essa assinatura sonora. Canções como “Julia dream” e “Paintbox”, singles lançados apenas em coletâneas, ou “Remember a day”, do segundo álbum, traziam seus teclados como instrumentos mais proeminentes, porém em fraseados simples e sem a textura perceptível nas criações coletivas da época, como “Careful with that axe, Eugene” ou “Interstellar overdrive”, essa última do álbum de estréia da banda, “The piper at the gates of dawn”.
“Nessa época, era Rick quem fazia os arranjos... E afinava o baixo de Roger”, explica Peter Jenner, empresário do grupo entre os anos de 1966 e 1968, em documentário exibido na BBC, em 2007.
Com a partida de Syd Barrett, até então o líder criativo da banda, porém enlouquecido pelas drogas, o Pink Floyd assumiu definitivamente sua vocação para um rock lisérgico e espacial, ao invés do psicodelismo dos primeiros álbuns.
“Syd fazia coisas absurdas na guitarra, que ninguém sonhava fazer na época. Tecnicamente não era um músico brilhante, mas, para mim, o que importa é a originalidade. E isso ele tinha de sobra. Acabou por influenciar totalmente minha maneira de tocar”, falou Wright à TV britânica, em 2006.
Tema do Jornal Nacional
Em "Sysyphus", suíte solo gravada no álbum duplo “Ummagumma”, de 1970, misturou órgãos, sintetizadores e piano, em que demonstrou essa mesma originalidade, além do bom gosto. No disco seguinte, “Atom heart mother”, contribuiu com “Summer ‘68”, música que confunde a cabeça dos fãs até hoje.
Trechos da canção foram utilizados num comercial do hoje inexistente Banco Nacional que, em 1969, era veiculado antes dos telejornais da TV Globo. Por conta disso, muita gente ainda acredita que a canção foi tema de abertura do Jornal Nacional na época.
Já em “Echoes”, que ocupa o lado B inteiro de “Meddle”, disco de 1971, divide o vocal com David Gilmour, além de contribuir para o que talvez seja a introdução mais emblemática de uma música da banda, em que usa o teclado para simular um sonar de submarino.
“Aquela música foi realmente uma criação coletiva. Todas as idéias foram respeitadas e aproveitadas, na medida do possível. De certa forma, encontramos ali, finalmente, a direção que deveríamos seguir sem Syd”, relembrou Wright, também na TV inglesa.
Veio “The dark side of the moon”, em 1973, o álbum mais cultuado do Pink Floyd, e com ele a popularidade e sucesso internacionais. A banda virou um fenômeno de vendas, revolucionou na maneira de gravar discos. E, mesmo se utilizando de temas mais melosos que nos álbuns anteriores, lá estava Wright e outras de suas contribuições: “The great gig in the sky”, “Speak to me/Breathe” e “Us and them”, em que se pode perceber as atmosferas e efeitos sonoros criados pelo tecladista que, influenciado por Miles Davis, deu o tom sombrio necessário às letras sobre morte, loucura e solidão escritas por Roger Waters.
Fora da banda
Mesmo os longos e antológicos solos em “Shine on you crazy diamond” e “Sheep”, músicas dos álbuns subseqüentes “Wish you were here” e “Animals”, respectivamente, não foram suficientes para manter a permanência do tecladista no trabalho seguinte. Como ele próprio conta, a partir do momento em que ele e Gilmour passaram a contribuir com menos freqüência, Waters se convenceu de que era o compositor oficial da banda. Foi quando Wright deixou o grupo.
“Nosso relacionamento ficou completamente abalado durante as gravações de ‘The wall’. Roger acreditava ser a banda em si. Então, me mandaram embora. Mas voltei para as apresentações ao vivo, pois queria terminar aquilo. Roger se mostrou feliz com meu desejo”, recordou.
O que se seguiu desse ponto em diante foram picuinhas pessoais entre os integrantes, batalhas judiciais e muito dinheiro gasto com honorários de advogados. Tudo por causa do nome Pink Floyd. A banda ruiu definitivamente após “The final cut”, já sem a participação de Wright, que viria a ser contratado como músico de estúdio apenas em 1987, em “Momentary lapse of reason”. Saiu em trunê pelo mundo com Nick Mason e David Gilmour e voltou à banda como compositor em “The division bell”, em 1993.
Redenção
O Pink Floyd ainda teria mais um show pela frente, o último com sua formação clássica. Aconteceu no Hyde Park, em Londres, durante o encerramento do “Live 8”, festival organizado por Bob Geldof, com apresentações simultâneas em várias partes do mundo.
“Usei três argumentos básicos para fazer com que os quatro subissem ao palco juntos mais esta vez. Primeiro: o Pink Floyd nunca teve uma despedida apropriada. Segundo: são apenas 20 minutos. Terceiro: não me digam que o Pink Floyd vai se reunir e fazer uma turnê a partir desse encontro. Não se trata disso, deve ser uma ocasião especial” , explicou Geldof à rede BBC em 2006.
Nick, Rick, David e Roger concordaram em se encontrar então, como contou Wright.“Tivemos uma reunião com Roger. Ele queria tocar outras músicas, mas David foi enfático. ‘Nós três somos o Pink Floyd e vamos tocar essas canções. Se você quiser participar, ótimo’. Ele concordou e, mesmo sem poder de decisão, adorou. Foi ótimo tê-lo ali ao meu lado. Me trouxe memórias e me emocionou”.
Roger Waters disse após o show: “Eu faria mais vezes. Outros shows, outros encontros”. Esse era também o desejo do público. Mas a idéia outrora distante tornou-se agora impossível
Fonte: globo.com
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